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voltarSTF abre precedente contra CNDs
Fonte: Valor Econômico
Fernando Teixeira e Zínia Baeta
Uma decisão inédita do pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) proferida na semana passada considerou inconstitucional a exigência de certidões negativas de débito (CNDs) de empresas para formalizar operações de crédito e para registrar contratos em cartórios. O julgamento derrubou parte da Lei nº 7.711, de 1988, mas está sendo visto como um precedente importante para se questionar uma das exigências mais incômodas feitas aos contribuintes: a prova de regularidade fiscal para a participação em licitações.
Na sessão de quinta-feira, os ministros do Supremo entenderam que a exigência de CNDs das empresas é uma espécie de sanção política, e só não afastaram a exigência das certidões em licitações, também prevista na Lei nº 7.711, porque consideraram o dispositivo revogado pela Lei de Licitações - a Lei nº 8.666, de 1993.
O caso foi julgado em um pacote de duas ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) propostas em 1990 pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Segundo o relator do caso, ministro Joaquim Barbosa, "as normas impugnadas operam inequivocamente como sanções políticas". Historicamente, segundo o ministro, o Supremo afasta a possibilidade de o Estado impor esse tipo de sanção ao contribuinte como forma de coagi-lo a quitar débitos fiscais. O ministro Carlos Alberto Menezes Direito afirmou que "é necessário fazer uma repressão imediata e dura com relação a esse tipo de exigência, porque o contribuinte fica completamente descoberto". O resultado foi unânime.
A Lei nº 7.711 exigia a apresentação de comprovantes da quitação de tributos para a participação em licitações, regra que foi alterada pela Lei de Licitações. Na regra de 1993, é necessária a comprovação de regularidade fiscal, o que é uma exigência mais branda. Enquanto a concessão de CND exige a ausência de qualquer débito com o fisco, a regularidade fiscal significa que não podem haver créditos em aberto - ou seja, sem contestação administrativa, judicial, parcelamento ou depósito. Com algum desses instrumentos, a empresa consegue uma certidão positiva com efeitos de negativa, e pode participar da licitação.
Para a advogada Manuella Vasconcelos Falcão, do escritório Bichara, Barata, Costa e Rocha Advogados, o Supremo vem consolidando uma posição contra a exigência de certidões negativas, e o novo precedente pode ajudar futuras ações que contestem a regra - inclusive uma ação que questione a Lei de Licitações. Ainda que seja mais branda, a exigência de regularidade fiscal também cria problemas para as empresas. Para Manuella, seria o caso de ver qual seria o pronunciamento do Supremo no caso da Lei de Licitações com o ajuizamento de uma Adin ou algum tipo de ação coletiva contra o dispositivo. Individualmente, diz Manuella, é pouco provável que advogados testem uma nova tese, pois em geral as empresas precisam de soluções rápidas e não podem arriscar. Os juízes de primeira instância também seriam pouco afeitos a adotar uma declaração de inconstitucionalidade do tipo.
O advogado Marcos Joaquim Gonçalves Alves, sócio do Mattos Filho Advogados, acredita, porém, que as chances de sucesso de um questionamento da regra prevista na Lei de Licitações com o uso do novo precedente não seriam grandes. "Pessoalmente, acredito que é possível o Estado exigir a regularidade fiscal", diz. Segundo ele, há uma grande diferença em se exigir a regularidade fiscal e a ausência de débito.
A advogada Valdirene Franhani, do escritório Braga & Marafon, no entanto, afirma que o julgamento poderá ser um argumento a mais para os contribuintes, que podem procurar o Judiciário não para questionar o débito que possuem a fim de obter uma CND, mas para questionar a própria necessidade da certidão. Bianca Delgado, advogada do escritório Décio Freire Advogados, lembra que o precedente é importante também para outras situações do cotidiano do contribuinte. "Há inúmeras situações em que se exige a quitação de débitos sem que a mesma tenha qualquer relação com a fiscalização", diz. "A exigência coage o contribuinte a pagar o débito."